Quem me conhece sabe que sou quase transparente de tão branca.
Por conta disso, já passei por várias situações inusitadas.
Sabia de cor toda e qualquer variação de branca azeda que uma criança podia inventar.
Praia era significado de caladryl à noite toda. Hoje, é sinal de programa para depois das quatro e somente após todo o preparo adequado com litros de protetor solar.
Calor sempre significou mal-estar ou uma boa dose de mau-humor (excelente mistura para quem vive 10 meses de verão no ano).
Mas, recentemente, passei por uma situação para lá de tragicômica por conta da minha branquidade:
Aconteceu logo assim que comecei a trabalhar no posto onde trabalho agora, numa comunidade em Niterói. Nos primeiros dias de trabalho, notei um falatório disfarçado sobre o assunto. Era só sair do consultório e ouvir das bocas ainda anônimas na sala de espera um burburinho cheio de exclamações contidas a respeito da minha (falta de) cor. No dia que ousei a ir de saia então, a quase fluorescência da minha batata da perna chocou a todos os presentes no posto. Tentaram, mas ficou difícil abafar os comentários.
Passados uns dias, a coisa acalmou. Assunto esquecido.
Algumas semanas depois, recebo no consultório uma já ilustre paciente. Muito indignada, ela fala:
- Doutora, esse pessoal aí de cima não tem mais o que fazer.
- Que houve, I.?
- Tão dizendo que a senhora é racista. Que não gosta de preto.
- Como? Eu não gosto de preto?
- Eu sei, eu sei, doutora, que não tem nada disso não. Você me abraça, me dá beijo... Eu falei lá em cima que isso era história.
- Aaaahm.
- Mas aí disseram que você era nojenta pois sempre lavava a mãp depois de examinar a gente.
- Hora, I. Mas faz parte do meu cuidado com vocês lavar a minha mão, para evitar que alguma doença passe de um paciente para outro.
- Eu sei, eu sei. Mas sabe como é que é, né? Quem não tem o que fazer inventa.
- I., a troco de que eu viria trabalhar aqui se eu fosse racista? Todas as auxiliares do posto são negras, a maior parte da população é negra... Só se eu fosse masoquista!
- O que doutora?
- Maluca, maluca, I.
- É, só se você fosse maluca, né? A senhora não parece maluca.
- Ainda bem, né ?
E assim foi a conversa. Funesta.
Alguém aí entende sobre racismo no Brasil?
Belo Monte - Belém
Há 12 anos
Um comentário:
o teu cabelo não nega, mulata
que tu és mulata da cor
mas como a cor não pega mulata
mulata eu quero teu amoooor!
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